Alagoano de
Palmeira dos Índios, Francisco, Chico para os íntimos, é, para quem não o
conhece, aquele sertanejo discreto, quase cabisbaixo, fuma quase cigarro de
palha, bebe quase cachaça destilada e quase é casado, com muitos filhos para
criar. Nasceu em ‘41, mas seu tempo é igualzinho ao tempo da nossa Chapada
Diamantina. Daquelas bandas lá de Rio de Contas, onde o tempo não tem tempo.
Prova disso, Chico [permita-me chamá-lo assim] possui um currículo invejável
mesmo por quem não é artista, desses que participa das poli-position das artes.
Chico contudo não é daqueles que chega sempre na frente, ele está na frente.
Ele é a vanguarda de uma arte cujas trincheiras da mediocridade não conseguem
cegá-lo. Nesses meados da primavera de ‘95, Chico está expondo aqui em Salvador
na Galeria do IPAC/Pelourinho.
Quisera
poder ter visto a prenhez de Chico diante dos aceleradores nucleares da França.
Ou quem sabe, a gravidez do sertanejo diante da seca. O Post-Atomicum de Chico
é decisivamente a aniquilação do simulacro. Lá não é mais a máquina como
intermediária entre o homem e o mundo. O hiper-real é o próprio homem.
Dilacerado pelas fiações das indústrias, fascinado pelas imagens
pré-fabricadas, o Homem Post-Atomicum de Chico é o próprio “épanouissement de
l’homme”.
A
perfeição de seus guaches, principalmente os mais recentes, é superior a uma
fotografia do interior de uma cabine industrial. Chico consegue instantaneisar
a luminosidade metálica das máquinas e dos equipamentos como se fosse provar a
pasteurização do mundo mecanicista. A mesma técnica transita pelos óleo sobre
tela e pelas reproduções em litogravura.
Nas
obras de Chico tanto o Homem como a máquina apresentam-se quase sempre
fragmentados, como se estivessem
possuídos um pelo outro. Como se a ‘mania’ [estar possuído por um deus]
dionisíaca lhe chegasse pelo embevecimento virtual. A gente também tem a
impressão que há um combate vital entre o Homem e a Máquina onde já se percebe
o vencedor. Mas a obra de arte como não precisa de veredictos, o nosso olhar
deve buscar sempre algo dela pelo viés de suas formas. Aí o Homem se impõe
pelas sinuosidades anatômicas, pela máscara da Górgona, pelo Cristo de Dali,
pelo Homem de Da Vinci. Chico reúne não só os símbolos da alma humana como
também suas representações na história da arte. Porém, o que ele faz mesmo é
atocaiar o Homem arcaico em meio às determinações do mundo tecnicista. Desse
modo, ainda podemos nos encontrar nas obras de Chico como alguém que está só no
labirinto do imaginário moderno.
Lourenço Leite, Salvador, Bahia, 1995
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