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sábado, 17 de agosto de 2013

A Filosofia no Cinema da Melancolia



Dor que pode sair pelos olhos, não é grande dor.
Pe. Antonio Vieira, As Lágrimas de Heráclito.

   
    
Lourenço Leite[1]
E-mail: lourencoleite@ufba.br

A estréia da filosofia no cinema se deu em 1895[2] quando os Irmãos Lumière apresentaram publicamente, em seu cinematógrafo, o primeiro filme. Ali acabara de nascer o olhar filosófico sobre o cinema, pois, não pode haver cinema sem a presença da filosofia. Isto é, sem a 7ª arte conduzir a trama cinematográfica ao conceito de sua obra.
Todos os elementos de um filme devem compor apenas uma sinopse — uma idéia. Um dos mais geniais cineastas do século XX, o russo Sergei Eisenstein, através de seu filme O Encouraçado Potemkin (Bronenosets Potymkin), de 1925 revela no conjunto de sua obra “a insurreição dos marinheiros frente à ditadura de sua época”. Poder-se-ia apenas concluir com a idéia = a insurreição.    A qual não se trata exclusivamente da insurreição dos marinheiros, mas de todos aqueles que estão insatisfeitos com as situações de opressão, de escravidão etc. A teoria de sua montagem foi baseada na didática e na estética marxista. A idéia desse diretor, mais tarde descoberto por Hollywood, pra variar, era construir um herói coletivo [tautologia mítica, porque todo herói, segundo a história da mitologia, pode ser coletivo], no caso forjado pelas massas russas, representadas pelos amotinados do encouraçado, o povo de Odessa [cidade do sul da Rússia] e insurrectos de outros navios — criando, portanto dois personagens: o encouraçado e a cidade; o drama [tecido pela dialética marxista] se construía com o diálogo e a união de ambos. Pois é, temos quase todos os elementos precedentes de análise que se remeteria, invariavelmente, a uma análise socio-política.
Desse modo, os infindáveis filmes produzidos dentro e fora dos circuitos midiáticos revelam a grandeza e a eficácia do cinema em fazer refletir a condição humana.
Fora disso, não se pode considerar cinema[3]. Esse fenômeno mundial que, desde sua origem etimológica (do grego  κίνημα – kinema = movimento) representa a realidade sempre de forma alegórica. Haja vista, que, em se tratando de arte, compõe a estética[4] (aisthesis em grego) e dela, subjaz a Estética Filosófica[5] ou Filosofia da Arte que não se deve confundir com a História da Arte. Em uma definição peculiar, Marilena Chauí condiz: Como o livro, o cinema tem o poder extraordinário, próprio da obra de arte, de tornar presente o ausente, próximo o distante, distante o próximo, entrecruzando realidade e irrealidade, verdade e fantasia, reflexão e devaneio (convite à filosofia).
Em vista disso, pode-se iniciar uma Estética do Cinema a partir da filosofia de Platão. Sua Alegoria da Caverna[6] p. ex., é predecessora de um roteiro cinematográfico sobre a busca do homem pelo conhecimento contendo elementos e personagens da realidade e, ao mesmo tempo, fora dela, isto é, um mundo sensível e outro inteligível (mundo das ideias) que, aliado à memória, desvela o ser das coisas. O cinema é isso. A arte de desvelar, alegoricamente, o ser das coisas, desta feita, através de imagens e de áudio em movimento. A filosofia cedeu lugar ao cinema nessa tarefa de desvelamento, pois se sedimentou, em sua história, com os silogismos, as idéias estéreis e o excesso de racionalismo. O conhecimento simbólico, oriundo do mito, restou ao largo e no entorno. No cinema é praticamente impossível descartar o mito. Assinalar-se-ia os filmes de alguns cineastas do Séc. XX em que destacam, sejam alguns ritos de passagem, seja toda a Jornada do Herói[7] (vide lista no apêndice). Na obra prima de Glauber Rocha[8], Deus e o Diabo na Terra do Sol, a Jornada do Herói se evidencia. O herói de Deus e o Diabo na Terra do Sol é Manuel. Aquele sertanejo que não tem a menor pretensão nem a maior presunção de ser herói ou libertador, mas sabe se indignar com as injustiças. É chamado, mas não sabe que é chamado. terá conhecimento do chamado após atingir a última etapa da jornada do herói. Em seguida Manuel empreenderá a caminhada em direção ao Hades [lugar onde reina Plutão, o senhor das profundezas da terra e soberano das paixões primitivas e recônditas do homem], como faziam os heróis míticos sob a forma de catábase [descida aos infernos, ida às profundezas da alma onde somente as paixões podem ser domadas]. O ponto de partida da catábase do herói sertanejo é o assassinato de seu capataz. É nesse momento que ele se dá conta de fugir, mas ao mesmo tempo deve, ao lugar de se redimir, empreender uma jornada de preparação para se tornar um justiceiro. Ou seja, alguém que possa enfrentar o dragão que protege as portas da cidade. No filme esse dragão é representado inicialmente pelo capataz ou patrão. Adiante veremos o dragão com inúmeras cabeças: o arcebispado local, o latifundiário e por fim a polícia. Manuel sente sede de libertação e sua sede o conduz a uma jornada sem retorno: a jornada do herói. Sua alma precisa ser forjada no cadinho da humilhação para não se tornar vaidosa. Jean Genet havia, em uma de suas veleidades, prefigurado essa constituição da alma do herói, quando disse em sua obra Querelle: a humildade que não provir da humilhação [provação] não passa de vaidade.
Glauber consegue mostrar, nessa obra prima, de maneira mito-poético, a pré-figuração do herói e a instauração do seu arquétipo coletivo. Seu pano de fundo, genialmente escolhido, não poderia ser melhor que o sertão. Com a presença da música de Villa-Lobos e da viola do trovador, ele universaliza a história do sertanejo que não tinha história. Com a presença do aedo do sertão ele nos ensina a tecer a trama da história, mas, sobretudo sua compreensão.
Em contrapartida, extirpar o simbólico da realidade é apenas vê-la sob a óptica da razão. A vida sem o simbólico destitui a humanidade de sua ancestralidade e de sua posteridade. Daí que o cinema se encarrega de reabastecer a vivência do simbólico através de sua representação da realidade.
Em se tratando de alegoria no cinema, advêm, outrossim, a necessidade, sempre constante, de interpretá-la. Pois a alegoria[9] sempre remete a algo de outrem. O termo alegoria, na filosofia contemporânea foi aprofundadamente cunhado pelo filósofo alemão Walter Benjamin[10] em sua obra Origem do Drama Barroco Alemão quando trata do conceito de história. Além do mais, Benjamin explora os conceitos de “símbolo”, “manifestação” e “idéia”. Contribuindo, desse modo, na construção da estrutura simbólica do cinema, quando assevera:
(...) é precisamente o uso fraudulento do “simbólico” que permite investigar em toda a sua “profundidade” todas as formas de arte, contribuindo desmedidamente para o conforto das investigações artísticas. O que chama atenção no uso vulgar do termo é que esse conceito, que aponta imperiosamente para a indissociabilidade de forma e conteúdo, passa a funcionar como uma legitimação filosófica da impotência crítica, que por falta de rigor dialético perde de vista o conteúdo, na análise formal, e a forma, na estética do conteúdo. Esse abuso ocorre sempre que numa obra de arte a “manifestação” de uma “idéia” é caracterizada como um “símbolo”.

A interpretação do cinema parte de seus símbolos e signos embutidos na obra remetendo o espectador a reuni-los numa síntese alegórica de modo a se chegar à idéia central. Aludindo a Rogério Luz em seu artigo de cinema A experiência do espectador comum de cinema, nota-se o seguinte:
Através do cinema o espectador acha-se confrontando à realidade: esta realidade é a de um mundo fictício, estruturado por um espaço e um tempo virtuais. O filme vem preencher a distância, figurada pela tela, que separa – ou une – o espectador e a realidade dada em efígie. Neste sentido, é verdade que o filme ocupa e mobiliza todo o psiquismo do espectador. Mas, diante do desfilar de imagens imediata e totalmente presentes e perceptíveis no interior da multiplicidade do espaço-tempo fílmico, o espectador não é passivo. Ele é conduzido a comportar-se como quem explora os percursos que se abrem dentro deste mundo imaginário. Não se trata apenas como no caso do filme de ficção, de tomar conhecimento progressivo do desenvolvimento da trama, do enredo. Trata-se, como no caso da obra de arte em geral, boa ou ruim, de aceder a seu processo formativo. (p.5).

Em função da engendração dessa interpretação e de como o espectador participa de seu entendimento é que se teve a honra e o privilégio de se poder ler uma das maiores e relevantes obras sobre crítica de cinema: os Cahiers du Cinéma. Criado em 1951 na França por cinéfilos oriundos de cineclubes para expressar os pontos de vista de intelectuais que se tornaram roteiristas e cineastas, tais como: François Truffaut, Jean-Luc Godard, Claude Chabrol.
Ler um Cahier du Cinéma era como se prover de um arsenal de elementos cinematográficos, passando do roteiro à fotografia, da direção às interpretações, dos símbolos aos conceitos, do roteiro à idéia central sem contar da rigorosa análise crítica dos editores que comparavam aquela obra com as demais do autor, mostrando sua evolução e superação artística, incluindo a dos atores. A remissão constante aos cineastas renomados, tais como: Fritz Lang, Serguei Eisenstein, Elia Kazan, Charles Chaplin, Orson Welles, Alfred Hitchcock, Jean Huston, Ingmar Bergman e muitos outros, faziam dos Cahiers du Cinéma mais que uma revista, uma obra editada por excelência que começara a fazer parte das estantes das melhores bibliotecas sobre cinema do mundo.
Atualmente, um dos filósofos da Sorbonne que recuperou essas análises da imagem (cinema) do ponto de vista filosófico foi Gilles Deleuze[11]. “O que me interessa são as relações entre as artes, a ciência e a filosofia. Não há nenhum privilégio de uma dessas disciplinas em relação a outra. Cada uma delas é criadora”.
Deleuze em parceria com Féliz Guatarri (1930-1992) recupera algo na filosofia que tivera sido iniciado por Walter Benjamin no que diz respeito ao problema do simbólico e da alegorização das artes no século XX. Produz uma “estética do pensamento” que auxiliará por demais na interpretação do cinema, pois reintroduz o sentido do simbólico no pensamento que faz acionar a imagem em movimento de novo, ou seja, além da imagem em projeção. Em sua obra A imagem-tempo, ele descreve essa entrada refortificante da imagem na esfera do pensamento:
                      Aqueles que primeiro fizeram e pensaram o cinema partiram de uma idéia simples: o cinema como arte industrial atinge o auto-movimento, o movimento automático, faz do movimento o dado imediato da imagem. Tal movimento não depende mais de um móvel ou de um objeto que o execute, nem de um espírito que o reconstitua. É a própria imagem que se move em si mesma. Portanto, nesse sentido, ela não é figurativa nem abstrata. Dir-se-á que isso já acontecia em todas as imagens artísticas; e Eisenstein sempre analisa os quadros de Da Vinci e El Greco como se fossem imagens cinematográficas. Mas as imagens pictóricas não são por isso menos imóveis em si, tanto assim que é o espírito que deve “fazer” o movimento. E as imagens coreográficas ou dramáticas continuam ligadas a um móvel. É somente quando o movimento se torna automático que a essência artística da imagem se efetua: produzir um choque no pensamento, comunicar vibrações ao córtex, tocar diretamente o sistema nervoso e cerebral. Porque a própria imagem cinematográfica “faz” o movimento, porque ela faz o que as outras artes se contentam em exigir (ou em dizer), ela recolhe o essencial das outras artes, herda o essencial, é como o manual de uso das outras imagens, converte em potência o que ainda só era possibilidade. (p.189).
Não se poderia deixar de mencionar que essa idéia de movimento deleuziana advém da tradição heraclitiana[12] do Devir. Ao retormar-se o devir como movimento, deslocamento na duração, (movimento e tempo) verifica-se que a expressão Todo Ente é no Ser, antes de o ser, somente é possível existindo na ação; consoante, Deleuze traz esse movimento para dentro do pensamento, por conseguinte envolve o corpo, porque não há pensamento sem corpo. Onde se conclui que o cinema possui a arte do movimento da imagem e do áudio e faz do espectador seu co-criador. A catarse aristotélica demonstrada na Poética toma assento no cinema. A tela em projeção, por analogia, é, o que o teatro grego era. Porém, com Deleuze, além do cinema auxiliar na catarse, ele engendra a possibilidade de crítica, pois converte em potência o que ainda só era possibilidade.
A configuração inicial da idéia de “movimento” no pensamento é uma herança oriunda do cinema russo, particularmente de Eisenstein. Acrescenta Deleuze:
Segundo Eisenstein, o primeiro movimento vai da imagem ao pensamento, do preceito ao conceito. A imagem-movimento (célula) é essencialmente múltipla e divisível, conforme os objetos, que são suas partes integrantes, entre os quais ela se estabelece. Há choques das imagens entre si segundo a dominante delas, ou choque nas imagens segundo seus próprios componentes: o choque é a forma mesma da comunicação do movimento nas imagens. E Eisenstein censura Pudovkin por ter anotado apenas o caso mais simples de choque. É a oposição que define a fórmula geral, ou a violência, da imagem. Vimos antes as análises concretas de Eisenstein, a propósito de O Encouraçado Potemkin e de O velho e o novo, e o esquema abstrato que delas se destaca: o choque tem um efeito sobre o espírito, ele o força a pensar, e a pensar o Todo. O todo precisamente só pode ser pensado, pois é a representação indireta do tempo que decorre do movimento. (ibidem, p. 191)
O Tempo, na imanência de todas as coisas, força o espírito a perceber sua essência no âmbito da duração. Deleuze apresenta-o como um choque que conduz o espírito a pensar o Todo. No cinema, esse todo se representa pela idéia central que se conclui através de todos os símbolos presentes na obra.
Ao se referir a Tempo, poder-se-ia remeter a um de seus mais tenebrosos efeitos: a Melancolia. Essa entidade divina que, depois de Géia, é quem assume o controle do destino de todas as coisas, possui, desde a Idade Média, uma conotação imperiosa de gerar nas pessoas, particularmente nos filósofos, artistas e poetas o espírito melancólico. Walter Benjamin em A Doutrina de Saturno descreve pertinentemente as características presentes na relação Tempo/Melancolia:
Como a melancolia, também Saturno, esse demônio das antíteses, investe na alma, por um lado, com preguiça e apatia, por outro com a força da inteligência e da contemplação, como a melancolia, ele ameaça sempre os que lhe estão sujeitos, por mais ilustres que sejam com os perigos da depressão ou do êxtase delirante... (ibidem, p. 172).
A ameaça de Tempo aparece no cinema de forma excepcional e notoriamente demonstrada em filmes de cineastas que pretenderam destacar em suas obras essa marca indelével da melancolia na existência humana. O cinema de Ingmar Bergman, John Huston, Luis Buñuel, Lucchino Visconti, Win Wenders, Ridley Scott, Stephen Daldry, Ang Lee e inúmeros outros, conseguiram sintetizar esse estado de espírito do homem contemporâneo que evolui, sem precedentes, na história da humanidade. Certamente, que essa nuvem melancólica que paira na modernidade urbana possui causas anteriores à Renascença[13]. Contudo, como afirma Benjamin: a teoria da melancolia cristalizou-se em torno de grande número de antigos símbolos, que, no entanto só foram interpretados segundo a imponente dialética daqueles dogmas graças à incomparável genialidade exegética da Renascença. (ibidem, p.174).
A melancolia no cinema se impõe em algumas obras de tal forma que chega a usurpar o conteúdo da obra. Conduz o espectador a antecipar a conclusão de sua compreensão na gradação imperiosa da presença da melancolia. Na lista de remarcáveis filmes que indicam a melancolia como Querelle de Fassbinder, O Sétimo Selo de Bergman ou Brokeback Mountain[14] de Ang Lee, As Horas de Stephen Daldry, Vivos e Mortos de John Ford, Os Deuses Malditos de Luchino Visconti, Blade Runner de Ridley Scott, As Asas do Desejo de Win Wenders, Frankenstein, de Kenneth Branagh, Noites Felinas de Cyril Collard, Bangkok Love Store (filme tailandês) de Poj Arnon, Melancholia de Lars Von Trier se pode notar que a melancolia é um dos temas do cinema mundial de nossa atualidade por excelência. Robert Burton, um dos maiores escritores sobre a melancolia no início da Renascença e que se destacou em seu tratado médico-filosófico A Anatomia da Melancolia paraboliza o seguinte: Quem não é louco? Quem é isento da melancolia?  Quem não foi mais ou menos atingido por ela de maneira passageira ou permanente? Atualmente, o modo de vida nas cidades modernas e o vazio da existência consolidado no pós-guerra, fazem do homem atual um ser marcado pela melancolia. Veja-se o que Hélène Prigent mostra em um dos excertos de sua obra Mélancolie —les métamorphoses de La dépression: O isolamento na cidade, o anonimato dos indivíduos, o estupor estampado nos rostos que não deixa penetrar nada (...) A estranheza inquietante se torna assim o único sinal de uma consciência maior que a existência que a abriga.
O cinema, portanto retrata esse comportamento do homem da urbanidade moderna que flana sozinho nas ruas da cidade e se fecha em seu mundo individual para se proteger de toda e qualquer contaminação com o outro.
“No intuito de tentar descrever um tipo de homem e de seu comportamento moral, Albert Camus, em A Queda, aproxima-se dos cais do “oceano” da existência moderna tendo como alegoria de fundo a tradição bíblica do homem vivendo no Éden e sendo expulso dele, tendo em vista a elaboração da nova morada edênica, contudo, sem a presença racional de outrem“.[15] Com esse cenário, o cinema enveredou na tentativa de entendimento e de denúncia da melancolia que brota de um tipo de sociedade em que, de um lado, o outro não tem permissão de presença e, de outro que a natureza é substituída pela realidade virtual.
Entrar no mundo da melancolia é se impactar de imediato com o mundo da solidão. Não há melancolia sem solidão. Durante décadas o cinema Cult tem se esmerado em explorar esse tema, pois se trata da experiência em que se vive atualmente de forma mais densa, profunda e aterradoramente melancólica. A solidão melancólica de nossa época é mais do que a presença do vazio; ela é a própria desolação como se verifica na representação mítica grega do rio Cócito (lugar por excelência da desolação, onde paira o frio glacial). Dante Alighieri na Divina Comédia o descreve como sendo o que se encontra no 9º círculo do inferno onde estão os traidores e onde habita Lúcifer.
Concernente a isso, Prigent assim descreve essa dubiedade: O melancólico é um solitário.  Isolado do mundo onde vive, desconfiado dos seus semelhantes, ele tem apreço pelos lugares desertos.  Ele, no entanto está longe de ser só: quimeras e fantasmas povoam sua solidão e o mantém no seu isolamento fazendo com que ele goste mais das delícias da imaginação às servidões da vida real.  A solidão do melancólico se apresenta em definitivo como o tributo pago à imaginação. Se o melancólico encontra refúgio no mundo alternativo da imaginação ou no virtual, considera-se que ele foge do mundo experimentando um ascetismo sem contemplação. Ele prefere, como o personagem Ennis Del Mar de Brokeback Mountain, sofrer a dor da ausência do absoluto do que se inter-relacionar com os outros. Ou como o herói que depois de cumprir sua missão, ocultar-se de todos e esperar o que outrora houvera experimentado em plenitude. O melancólico está aí no mundo e igualmente ausente dele. Em O Sétimo Selo, Bergman revela na face do protagonista esse desejo de tornar-se pleno mesmo sentindo o maior dos vazios, a solidão da existência. Melvyn Bragg em seu livro sobre O Sétimo Selo narra assim o filme de Bergman:
Um Cavaleiro e seu Escudeiro voltam das Cruzadas. O país está assolado pela peste. Eles se encontram com a Morte e o Cavaleiro faz um trato com ela: enquanto conseguir contê-la numa partida de xadrez, sua vida será poupada. Na viagem pela terra natal encontram artistas, fanáticos, ladrões, patifes, mas por toda a parte a presença da Morte, empenhada em ganhar o jogo por meios lícitos e ilícitos. No fim, todos, menos os artistas, são arrebanhados por ela. Intelectualmente a trama do filme é entretecida por dois fios: o da busca, pelo Cavaleiro já desesperado, de alguma prova alguma confirmação de sua fé, e o da atitude do Escudeiro, para quem não existe nada, para além do corpo em carne e osso, senão o vazio (p. 26-27).




A demonstração do vazio está presente em toda a obra de Bergman, contudo, o sagrado é simultaneamente representado. Se o personagem depara-se com sua finitude diante da Morte, ele não possui conteúdo sacro que lhe permita transcender ao Todo. Ele se recusa morrer, mas também almeja possuir a fé dos artistas mambembes que em todo o filme prestam culto ao sagrado. O final apocalípto em que o Anjo quebra o Sétimo Selo, a Morte pode cumprir sua tarefa de conduzir a quase todos na montanha do além. O Cavaleiro agora não precisa mais esperar o encontro com o Absoluto. Ele não mais virá, Ele o aguarda.
Há uma ausência de culto do sagrado que impede o homem contemporâneo regozijar-se com o absoluto. Vale destacar a seguir o que Bergman escreveu na introdução do roteiro de O Sétimo Selo:

Pondo de lado as minhas crenças e as minhas dúvidas, que não tem importância neste caso, é minha opinião que a arte perdeu seu impulso criador básico no momento em que se separou do culto. Ela cortou um cordão umbilical e leva agora uma vida estéril, gerando-se ignorado e sua obra existia para glória de Deus. Ele vivia e morria sem ser mais importante do que outros artesãos; “valores eternos”, “imortalidade” e “obra prima” eram expressões não aplicáveis no seu caso. A capacidade de criar era um dom. Num mundo assim floresciam a convicção inabalável e a humildade natural.
 A representatividade do culto ao sagrado não é tarefa fácil nem accessível de todos os cineastas. Vale dizer que apenas alguns se arvoraram em pretender mostrar esse culto, mesmo porque, dependeria da obra que dera origem ao roteiro adaptado. O filme O Pagador de Promessas (baseado na obra de Dias Gomes) de Anselmo Duarte ganhador da Palma de Ouro de Cannes como Melhor Filme Estrangeiro em 1962 é uma dessas representações magistrais do cinema que abarca na mesma película todos os elementos que fazem da 7ª arte o ápice da Arte. Nesse filme se pode ver o sincretismo religioso que por si só é algo de inextrincável, mesmo diante de um rito religioso. O diretor consegue mostrar isso no desejo de Zé do Burro em pagar sua promessa feita a Santa Bárbara num terreiro de candomblé por ter curado seu jumento e companheiro; na recusa da Igreja Católica em aceitar seu pagamento dentro do templo; dos Filhos e Filhas de Santo do Candomblé em se mostrarem acolhedores ao seu propósito; do povo que se rende ao fenômeno religioso e que transita entre as duas religiões; da melancolia e da angústia do protagonista diante daquela sangrenta rejeição.




O culto ao sagrado não se configura apenas em ritos religiosos. Ele aparece disfarçado na preservação da honra familiar da qual deverá nascer um herói que possa interromper a tragédia familiar de mortes e de vinganças. O ciclo se interrompe quando o sangue de um inocente é derramado no solo do sertão, como se encontra em Abril Despedaçado[16] de Walter Salles; na dignidade da existência reivindicada pelos replicantes e na busca imorredoura de encontrar o seu criador, faz do filme Blade Runner[17] de Ridley Scott o culto equivocado do sagrado da vida que não pode ser criada pela engenhosidade da engenharia genética; ou na sacralização do sexo em Sexo por Compaixão de Laura Mañá.
            Os cineastas que decidiram mostrar na imagem/áudio do cinema a condição humana, não poderiam deixar de retratá-la sob a aparência da melancolia.  A melancolia é a saudade do absoluto que se manifesta na existência até que a música traga-o de volta a casa da Alma. A música, ademais, no cinema, perpassa todo o filme e revela a essência do que o diretor não conseguiu mostrar na gravação de cenas da realidade. A percepção do vazio da existência em Blade Runner sem a música de Vangelis não configuraria a profundidade melancólica que o filme possui.
A angústia e o desespero vividos pela personagem que não sabe mais lidar com o peso da existência cotidiana, mesmo que ao seu lado encontre-se o seu companheiro que suporta, por osmose, o sofrimento e a dor, em 37º2 Le matin – Betty Blue. Com a música de Gabriel Yared o filme se torna a marca melancólica do vazio, resultado da vida moderna, conduzindo, pouco a pouco na veia do desespero da personagem o sangue da dor do vazio, até que venha a tentar suicídio.
No filme Casablanca de Michael Curtiz (música de Max Steiner interpretada por Louis Armstrong) a célebre e clássica música As time goes by, pontua, ao som do piano do leal Sam, cada ação de espera no café/cassino a decisão da partida de Rick (Humphrey Bogard) antes que a guerra arruíne tudo, deixando para trás seu grande amor, vivido por Ingrid Bergman. O ambiente esfumaçado, quase lúgubre devido a tensão da partida de Rick e o som do piano, completam a harmonia do cenário perfeitamente melancólico que somente o cinema pode expressar.
Os Deuses Malditos[18] (música de Maurice Jarre) traz o peso da aristocracia alemã em sua decadência familiar, a falsa moral burguesa e a luta desesperada pela posse da herança multimilionária.
Além de perpassar no filme a música de Jarre, o ator Helmut Berger imita a Marlene Dietrich de O anjo Azul, causando no ambiente um escândalo sem precedentes, contudo, dando ao filme uma das cenas mais antológicas do cinema de Visconti. Aí a melancolia aguarda os instantes das cenas e as atuações dos atores para se mostrar no vazio de um tipo de sociedade que não se sustenta mais. Tudo se mascara em público e revela o espectro da farsa. O ódio impera e o amor é camuflado nos quartos sombrios da traição e do poder absoluto.
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Frankenstein, sem embargo, é a obra mais importante do cinema concernente a ausência total da presença de Deus. Mesmo que tenha sido baseada na genial e marcante obra de Mary Shelley escrita entre 1816 a 1818 com o título Frankenstein ou o Prometeu Moderno[19] ela reflete com primorosa descrição o liame desencadeado na Renascença entre o Criador e a Criatura.
A primeira versão de Frankenstein data de 1910 por J. Scarle Dawley, entretanto é na adaptação de Kenneth Branagh de 1994 que a obra adquire uma suntuosidade metafísica inigualável. A narrativa clássica se debruça sobre o empenho obsessivo de um cientista o Dr. Frankenstein em criar um novo homem a partir de pedaços de corpos humanos usurpados em necrotérios. À medida que adquire as partes para formar um novo corpo, vai se tornando mais obsidiante com a empreitada e com o gosto da criação. Finalmente atinge seu preito com o anti-sagrado.  O corpo restaurado havia adquirido vida e essa criatura passou a se chamar Frankenstein (etim. quer dizer “a pedra dos francos”) em alusão ao seu criador.



Analogamente ao Ser Humano, não se sabe ao certo de onde vira o seu espírito. Possivelmente viera da Physis Cósmica onde habitam uma infinidade de seres e espíritos aguardando o momento de uma encarnação ou, como afirma o espiritismo, uma reencarnação. Do ponto de vista metafísico, o ser é sempre proporcional ao ente, deveras que analógico a sua singularidade. Em Frankenstein o ser se mostra apenas como projeção do seu duplo[20], ou seja, o próprio criador revelando sua estranheza. O trabalho acadêmico O Duplo em Frankenstein de Marília Mattos do Instituto de Letras da UFBA destaca as origens desse conceito, do seguinte modo:
O monstro, ao mesmo tempo que revela algo – a diferença –, suscita terror.  Onde o esperado seria a reverência a seu caráter divino encontra-se, substituindo-a, a ojeriza. O monstro (profano) toma lugar do monstrum (sagrado), assim como a criatura frankensteiniana usurpa o nome de seu criador – como prova o imaginário popular. A palavra monstro tem em comum com unheimlich, além de seus sentidos contraditórios, o fato de revelar o que causa temor. Se o duplo é o estranho, o ameaçador desdobramento de si, também o monstro, ao revelar, faz lembrar (e este é um dos sentidos que o dicionário lhe atribui) e despertar o recalcado. Por que teria a revelação degredado-se, de divina que era, para profana? Tal questionamento remete-me à hipótese de que o “íntimo” (heimlich) e o “estranho” (unheimlich), revelados pelo monstro, nem sempre foram abominados, mas sim divinizados e reverenciados.
A expressão bíblica “o Homem foi feito à Imagem e Semelhança de Deus”, consuma-se agora apenas na Imagem, posto que a Semelhança fora extinguida da relação Deus/Homem ou Criador/Criatura. Instala-se, desde a entrada na modernidade a primazia da imagem, como referendum da Estética da Existência, a Ética, por sua vez, liquefaz-se na esfera exclusiva da moral. A maior e melhor representação dessa redução da Ética à Moral encontra-se na obra O Estrangeiro[21] de Albert Camus, em que o protagonista é condenado à morte, não por ter cometido um crime, todavia, por não ter chorado no enterro de sua mãe, instaurando desse modo a Ética do Absurdo[22].
 O fato do Dr. Frankenstein recolher pedaços de corpos faz-nos obrigatoriamente remeter-se ao diaparagmós[23] sofrido por Osíris, divindade arcaica do Egito Antigo cometido por seu irmão Seth. A reunião das partes do corpo de Osíris foi feito por sua esposa Isís, a grande mãe da natureza, de modo que pudesse ser restaurado em outra vida. Contudo, em Frankenstein a reunião das partes do corpo humano não são engendradas por nenhuma divindade. Aqui, o homem é Senhor Absoluto da existência e, ao realizar a tessitura do corpo, inocula nele o germe do vazio e da angústia. Mas, muito embora o “monstro” não possua uma alma imortal, revela as mesmas inquietações metafísicas do homem de sempre: quem sou eu? Por que meu pai me abandonou? Por que sinto falta de alguém que seja como eu sou? Perante tamanha insistência e desespero da criatura, o Dr. Frankenstein decide criar uma companheira para ele que veio a se chamar, “a noiva de Frankenstein”.
Mesmo em face de uma companheira sem êxito, a criatura vaga pelo mundo à procura de seu criador – seu pai. Com faro de tigre alcança o polo ártico numa gélida e incansável aventura no rastro de sua presa. Aqui, o cenário desolador, simbolicamente, remete-nos ao rio Cocito do Hades ou ao Círculo dos Infernos de Dante. Nenhum vivente deveria suportar tal passagem, pois é lá em que a alma dos ímpios é castigada vindo a sofrer a pior de todas as experiências humanas — o abandono. Não há nada nem nada a se consolar – o vazio é aterrador, pois o Espírito de Deus não habitara naquele lugar sem Tempo. A idéia da obra, seja de Shelley ou de Branagh, é mostrar a experiência do vazio da existência atingindo o cume da melancolia. Parafraseando Camus, a culpa ou o pecado, ocupam no mundo moderno o estado de absurdidade em que tudo é possível. O absurdo, que é o estado metafísico do homem consciente, não conduz a Deus. Talvez esta noção se esclareça se eu arrisco esta enormidade. O absurdo é o pecado sem Deus (Mito de Sísifo, p. 58).

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Twin Peaks[24] (música de Ângelo Badalamenti) uma das mais importantes e influentes séries norte-americana, revelou pela primeira vez na TV o grau de angústia da sociedade de classe média burguesa, seus conflitos existenciais e sua culpabilidade com a indiferença ao Outro. A série fora adaptada para o cinema, porém, ao invés de reconfortar seus fãs, revelou uma inoperante e incompetente versão que, para quem vira a série, ficara em suspensão a riqueza da trama e da profundidade de sua cinematografia. David Lynch tivera experiência em filmar Duna, e, naquela época, já revelara a capacidade de enaltecer o cunho melancólico de seus personagens, mesmo em se tratando de uma de ficção científica.




Em Twin Peaks ele se superara totalmente. A riqueza de detalhes de investigação do FBI; o trazer à tona da verdadeira personalidade dos habitantes da pequena cidade e a seita secreta que preserva sua confidencialidade à toda prova, inclusive com novos assassinatos. Os amigos de Laura Palmer, desolados e inconsoláveis, demonstram o quinhão pago por um tipo de sociedade que não possui nenhuma forma de transcendência. Impera o vazio da existência e a melancolia reina no absoluto do cotidiano. Não há mais nada a transpor, a não ser a preservação dos iguais em que a diferença fora assassinada. A música de Twin Peaks é a maior obra melancólica do cinema do século XX. Cada tom musical é sentido no diafragma da solidão. Uma das melhores cenas da série se passa num café em que dois amigos de Laura relembram o passado vivido com ela e a impotência diante da não compreensão pelo ocorrido. A música de fundo de Badalamenti é inteiramente integrada ao cenário ambientando com os dois jovens, fumando e bebendo o vazio.
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As Horas[25] (música de Philip Glass) filme de Stephen Daldry, baseado na obra homônima de Michael Cunningham, mais uma vez é o cinema contemporâneo anglo-estadunidense descrevendo o estado d´alma do homem diante do vazio, acentuadamente nas personagens femininas inspirados em Virginía Woolf. De forma inusitada, destaca inclusive um personagem infantil que cresce no seio do nada da relação dele com a mãe. É o protótipo do homem futuro que já está presente. Vivem, na serenidade do dia-a-dia tentando incluir o outro a todo custo, mas o solipsismo de suas subjetividades não o suportam por possuírem diferença além de suas totalidades do mundo do mesmo. O suicídio cometido por Richard, doente de Aids, interpretado por Ed Harris, quase não repercute na teia das relações porque a força imperiosa do nada invade a vida de todos. A melancolia se mostra como depressão e tristeza, marcas resolutas do século passado, sem poder se mostrar como saudade do absoluto ou da falta de transcendência. A música, por sua vez, invade o espectador ao invés dos personagens, como um deus ex maquina de tragédia grega, descendo na tela do cinema para relembrar o passado e tecer o futuro. Todavia, seu eco não repercute nos personagens. O som da música já é o som da alma do homem do nada que sobrevive nos limites da existência — o vislumbre seria a audácia do suicídio.

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Bangkok Love Store[26] (música de Giantwave “I want to know, but I don’t want to ask”) é um filme tailandês de 2007 do diretor Poj Arnon que aborda um drama homossexual vivido por um assassino de aluguel e um jovem policial que deveria ser sua vítima.
A trama é perpassada pela vida em paralelo do jovem Iht e a de Maek, redimensionando o problema da AIDS trazido pelo estupro e pela miséria.




A música de Giantwave dá um toque quase clássico da paixão proibida dos amantes, evidentemente da sofrida por dois homens heterossexuais. Algo de inédito nos dramas asiáticos, mesmo nos do cinema ocidental.
A questão que se impõe não é necessariamente a do relacionamento entre dois homens, mas, sobretudo da instauração do sentimento humano de paixão que se torna amor incondicional entre duas pessoas que aprendem a desejar a alteridade.
O diretor consegue fazer com que os atores, ditos heterossexuais, entrelacem-se de um dos modos mais tórridos do cinema GLBT, que dá impressão de um filme do cotidiano hollywoodiano.  Mas trata-se de um filme asiático com todas as características de uma cultura que não possui a tradição do romance gay no cinema.
A música é magistral, fora composta para o encontro e o desencontro dos dois amantes. Porém, muito embora represente o sentimento avassalador dos dois, ela se firma contundentemente na ausência de Maek, o matador da máfia. O jovem mancebo não sucumbe em nenhum momento à paixão nem à solidão vivida sem a presença de seu imponente amor. Espera diligentemente sua saída da prisão, mesmo enfrentando a cegueira que lhe acometera quando da vingança ao chefe da máfia por seu amor, agora companheiro. Nos grandes momentos cruciais do filme, a chuva e as poças d´água fazem-se presentes. O amor começa dentro d´água e se consuma em cima dela. O puro e o impuro se abraçam sofregamente e se eternizam no enlace da volúpia. Chegara a hora da filha de Eros e Psiqué gerada pela melancolia do conluio mais intrépido e mais corrosivo. A da ausência do outro.

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Melancholia de Lars Von Trier (2011), música baseada em Tristão e Isolda de Wagner contém todos os elementos para ter sido um grandioso filme de referência do cinema do séc. XXI sobre a melancolia; mas não consegue fazer a síntese esperada.
A protagonista Justine (Kirsten Dunst) remete aos personagens das respectivas obras Justine e Juliete do Marquês de Sade[27], trazendo ao cinema a bomba da anti-moral cristã e o absurdo da existência no seio da cultura escandinava. As filmagens são demonstrações de incompetência técnica, mesmo que pareçam propositais. A estética do filme é aleatória demais, sem juncos definidos do belo no pântano opaco da existência.




Ao invés de mostrar uma melancolia do dentro, prefere inseri-la na figura de um planeta (Saturno) que se choca com a terra. Haja vista que há uma impossibilidade astrofísica de um astro superior a Lua colidir com a Terra, devido a força de gravidade exercida pelo seu astro rei. Seria o mesmo que representar a colisão da Terra com Saturno. O planeta representa, desde os medievais, o signo da melancolia que analogicamente é Tempo (Chrono/Saturno). O final trazido por Tempo nunca foi apocalíptico, mas deveras ressurgimento, renovação. Von Trier prefere o niilismo do homem ao de sua superação; o aniquilamento da criação ao da renovação. A melancolia no filme desocupa o lugar por excelência da criação, se referirmo-nos ao Problema XXX de Aristóteles. Ou a exaltação poliforme de Robert Burton em sua primorosa obra A Anatomia da Melancolia de 1621 que definira a melancolia como: um tipo de loucura sem febre, tendo como companheiros o temor e a tristeza, sem nenhuma razão aparente. Não há temor no Melancholia de Von Trier e a tristeza é lúgubre o suficiente para não se mostrar como melancolia. A tragicidade perante o extermínio traz apenas à tona uma dose tênue de humanidade nos personagens que causaria piedade a qualquer iniciante em mitologia. Os símbolos míticos são cobertos por um gélido apanágio e esgotam em si mesma toda possibilidade de analogia com o real da existência. Mas vale admitir que sua tentativa de simbolização, no lugar de se constituir na esfera do humano, apela para a natureza. Os animais: as aves em revoada e o cavalo que não ultrapassa o limite da propriedade lembram os antecedentes da natureza, como ocorrera na Indonésia em 2004 antes da chegada do tsunami. O homem da urbanidade moderna perdera por completo a sintonia com os fenômenos da Physis e, consequentemente, com o Cosmos.
Tudo permanece no fora e na superfície; tudo é somente julgado pelos fatos morais, destituídos de toda Ética no solo do absurdo. Decerto que os personagens são marionetes de uma existência sem vida e sem pensamento. Os diálogos, como define Alex Bezerra de Menezes[28] em sua resenha brilhante sobre Melancholia: inconclusivos do filme parecem intencionais, porque em verdade o que interessa não é a agonia da espera da hecatombe, mas como cada um lida com o fim próximo e isso só pôde me remeter a Dostoievski, para quem o pior do castigo era a espera. E essa espera impotente, a incerteza de que o Melancholia vai ou não abalroar a terra desestabiliza as personagens.
Há no filme Melancholia um inextricável destino do humano, negando a liberdade e valorizando apenas os sentimentos, como ocorre na avassaladora onda de messianismos das supostas igrejas evangélicas dos nossos dias. Pensamento e ação foram derrotados pelas emoções; não há mais espaço para o novo; sendo assim, na descrição metafísica do sofrimento inútel, Lévinas ratifica:
(...) o sofrimento não fosse somente um dado refratário à síntese, mas a maneira pela qual a recusa, oposta à reunião de dados em conjunto significativo (sensé), se lhe opõe; a dor é, ao mesmo tempo, o que desordena e a ordem e o próprio desordenamento. Não somente consciência de uma rejeição, ou sintoma de rejeição, mas a própria rejeição: consciência ao avesso, “operando” não como “apreensão”, mas como refulsão (repulsão, conf. original em francês[29]). Uma modalidade. Ambiguidade categorial de qualidade e de modalidade. Negação e recusa de sentido, impondo-se como uma qualidade sensível; eis à guisa de conteúdo “experimentado” a maneira pela qual, numa consciência, o insuportável precisamente não se suporta, a maneira de não-se-suportar, a qual, paradoxalmente, é ela própria uma sensação ou um dado. Estrutura quase contraditória, mas contradição que não é formal como a da tensão dialética entre o afirmativo e o negativo, se produzindo para o intelecto; contradição à guisa de sensação: dolência da dor, mal. (Entre Nós, p. 128/1290.
O Kairós não se revela mais como epifania do ser, pois se está à mercê do Caos. Por conseguinte, não há mais revolta nem indignação diante das injustiças, porque a existência houvera completado seu ciclo — a alteridade soçobrou na finitude da totalidade do igual, resta-lhe apenas o “Outro absolutamente Outro”, como bem afiançou o filósofo lituano no século XX, Emmanuel Lévinas: Na existência humana que interrompe e supera seu esforço de ser — seu conatus essendi spinozista — a vocação de um existir-para-outrem mais forte que a ameaça de morte; a aventura existencial do próximo importa ao eu antes que a sua própria, colocando o eu diretamente como responsável pelo ser de outrem (ibidem, p. 19).
De forma conclusiva, a reboque de Menezes, considera-se que: Enfim, a mitologia de Von Trier é a do desencanto, do inescapável destino absurdo do homem na face da terra. Criando esse lugar impalpável, longe do alcance da razão, o dinamarquês reflete com espelho sanguíneo o atual estado em que as sociedades vivem esse turbilhão tecnológico conjugado com a fragilidade das relações pessoais. Como todo bom catastrofista, Von Trier prega que a melhor saída para nós é a destruição, única fonte possível de redenção.
A intenção de Von Trier em denunciar a chegada da melancolia na sociedade contemporânea não revela o estado de espírito em que ela sempre esteve inserida desde os primórdios da humanidade, quando o homem caiu no âmbito da mundaneidade. A “Queda” adâmica ou a perda da pureza de Enkidu (da Epopeia de Gilgamesh) referendam esse estágio do homem. A saudade da plenitude e o seu distanciamento geraram no homem a doença sem cura da melancolia. Na modernidade contemporânea, alguns pensadores, literatos e poetas dedicaram ao aprofundamento desse tema, tais como: Kierkegaard, Rimbaud, Heidegger, Hölderlin, Fernando Pessoa, Albert Camus, Dostoïevski, Kafka, Freud, Emil Cioran, Marguerite Duras, Marguerite Yourcenar, Julia Kristeva, Giorgio Agamben sob o prima da “angústia”. Com efeito, a Dinamarca e os demais países escandinavos, o Alasca, a província do Quebéc, alguns países europeus e asiáticos, como o Japão, já se consagraram na irremediável melancolia. Pouco a pouco, ela se propaga nos trópicos, conduzida pelas caravelas portuguesas movidas por Saturno, como assinalou Moacyr Scliar em Saturno nos Trópicos e pelos escravos negros da África portando o seu Banzo como resultado do desterro[30].

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O segredo dos seus olhos [El Secreto de Sus Ojos] de Juan José Campanella[31], produção argentina de 2009 revela um novo olhar cinematográfico perante a experiência do vazio e a performance do nada oriundos da melancolia contemporânea. O cinema argentino tem se destacado em meio às produções latino-americanas da Colômbia, Venezuela, Peru, Chile, Uruguai e México, sem, contudo, deixar-se de enfatizar filmes desses países de extraordinária beleza, qualidade artística e enredos originais. Ao passo que a Argentina tem se superado nas produções e tem se mostrado ao público internacional, quase como uma revelação do cinema contemporâneo, efetivamente, não há dúvida.
O filme de Campanella, à luz da crítica de Vlademir Lazo no site[32]: cineplayers.com, se apresenta de forma mais real que as verificadas nos festivais. Escreve ele: O grande trunfo de O Segredo dos Seus Olhos é o seu elenco, especialmente o ótimo Ricardo Darin como o personagem central. Trata-se de uma performance melancólica que confere o tom ao filme, no papel de um sujeito que passou a vida como sabendo que se lhe reserva um destino medíocre. O seu Benjamin Espósito em dado momento se pergunta: “Como se faz para viver uma vida vazia?” ou a variante “Como se faz para viver uma vida cheia de “nada”?”.
Evidentemente que o filme ultrapassa os liames da mediocridade, apesar de não ser em totalidade uma grande obra. Não obstante, o que está em discussão não é a sua cinematografia, mas seu caráter de revelação melancólica e sua versão da antiética do humano.




Em nenhum marco da história do cinema, a não ser do cinema contemporâneo, se pode ver a inversão total da “ética da alteridade” nas mãos do vingador. Semelhança de enredo encontra-se no filme atual de Almodóvar, A Pele que Habito de 2011 que põe o espectador numa posição jamais vivida. Aniquilação por completo, na efetivação da vingança de um suposto estupro de sua filha, o estuprador, transformando-o, graças às novas técnicas de cirurgias anatômicas e genéticas em uma mulher e, simultaneamente, vindo possuí-la e amá-la.
Jean Genet, novamente vem à baila: o homem só mata aquilo que ama. O niilismo chegou ao cinema de forma estonteante, revelando a insanidade do homem do vazio. Não há mais culpa nem remorsos, nem arrependimentos a redimirem-se. “O grito da culpa[33]” que ecoa nos cais do absurdo de Camus em sua magistral obra A Queda, torna-se o mais atual dos atuais comportamentos do homem das metrópoles. Decerto que, apesar do crítico Lazo ensejar apenas o aspecto da obsessão do povo argentino, ao sinalizar que É louvável que na vida real (...) tenha a necessidade de purgar as manchas do seu recente passado histórico julgando e condenando os seus antigos déspotas ainda vivos, mas no cinema a obsessão pelos períodos dos regimes ditatoriais latino-americanos é um filão que cansou há muito tempo o filme engendra um além da obsessão de vingança. Mesmo porque um povo só redime seu passado na justiça. O desfecho é a prova cabal da qual o cinema consegue suplantar a via dessa repetição angustiosa da vingança. O que se impõe é o problema da anulação do outro. Prova disso, o que tivera sido a vítima, torna-se o algoz com requintes de crueldade que nem o nazismo houvera coragem de praticar — A negação da linguagem lhe é conferida tornando, o pior dos homens, em nada absoluto. Haja vista que há uma impossibilidade de nulificar o ser humano, pois o ser, do ponto de vista metafísico, não pode ser negado. Mas, com efeito, o carrasco no filme o realiza. O carrasco é o protótipo do novo homem sem transcendência. Não há o que temer, não há do que se culpabilizar, não há nada a ser julgado pela lei. A punição é cumprida sem perdão e sem possibilidade de arrependimento, como bem afiançou Kierkegaard em In Vino Veritas:
A memória, quando é continuamente refrescada, vai enriquecendo a alma com uma profusão de pormenores que distraem a recordação. Assim, o arrependimento, por exemplo, é um recordar da culpa. De um ponto de vista puramente psicológico, acredito que de fato a polícia ajuda o criminoso a não se arrepender. Por via da constante narrativa e repetição do seu trajeto de vida, o criminoso ganha uma tal prática em papaguear de memória o vivido, que resulta banida a idealidade da recordação. Requere-se grande idealidade para um real arrependimento, e, sobretudo para um pronto arrependimento; pois o que a natureza também pode ajudar o indivíduo, e o arrependimento tardio, que para a memória não tem importância, é muitas vezes o mais difícil e mais profundo (p. 22).
Em O Segredo dos seus olhos o prisioneiro não deve se arrepender nem pode pedir perdão. Não há lugar na linguagem do vazio e do silêncio para esse procedimento. Daí a mais execrável de todas as punições, pois alcança o limiar do inferno em vida. O homem assume o papel de Deus e não há mais limites para a crueldade. A vida passa a ser eterna no âmbito do efêmero.

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A melancolia no cinema tem imprimido uma marca indelével que se desenvolve em todos os cantos do mundo. Da Tailândia com Bangkok Love Store de Poj Arnon ao Canadá, destaque para As Invasões Bárbaras, O Declínio do Império Americano de Denys Arcand; da Dinamarca com Melancholia de Lars von Trier à França com representações desde Belle de Jour de Luiz Buñuel ao Une Affaire de Gout de Bernard Rapp; da Mongólia com Camelos também choram, documentário de Byamba Sureu ao Japão com seus Samurais através de Akira Kurosawa ou com a indignação de Mishima. Da Holanda à Alemanha com sua filmagem de A Fita Branca, da Espanha de Almodóvar agora com A Pele que Habito; da Colômbia/Peru com seu inusitado Contracorrente de Javier Fuentes-Léon à Suécia com O Sétimo Selo de Ingmar Bergman. Da Argentina com Plata Quemada de Marcelo Piñeyro ao Brasil com Abril Despedaçado de Walter Salles.
Não se pode mais olvidar o germe que se instalara no seio da humanidade desde os primórdios e que, somente agora, adquire status de doença sem cura. Pois se trata de um estado de espírito que os antidepressivos não tem força de sedação, assim como os neurotransmissores não obtêm êxito na restauração da teia neural partida pela melancolia; o uso do Prozac e de lentilhas não garantem a felicidade do melancólico. A manifestação, talvez, das mais relevantes da melancolia não vem encoberta de paliativos, mas de choro velado e lágrimas que não aparecem e da dor que não cessa. Parafraseando o Pe. Antonio Vieira em um dos seus nobres discursos proferidos para a Rainha da Suécia em Roma, sobre As Lágrimas de Heráclito: “A dor moderada solta as lágrimas, a grande as enxuga, as congela e as seca. Dor que pode sair pelos olhos, não é grande dor; por isso não chorava Demócrito. E como era pequena demonstração da sua dor não só chorar com lágrimas, mas inda sem elas, para declarar-se com o sinal maior, sempre se ria”. (p.1115). Daí se poder concluir sem subterfúgios que o melancólico possui um dos humores mais refinados entre os homens; contudo, não o exclui do sentimento da dor, nem de suas lágrimas heraclitianas que caiam por conta da miséria humana. O melancólico sabe se angustiar assim como sabe se indignar, mesmo porque como afirmou Kierkegaard em sua obra O Conceito de Angústia, a angústia tem o mesmo alcance que a melancolia em um estado já muito ulterior, quando a liberdade, após ter passado pelas formas mais imperfeitas de sua história, tornou a conquistar-se no mais profundo de si mesma. (...) a angústia é a realidade da liberdade como puro possível (p.51). O melancólico aí reside na experiência da possibilidade, pois a realização seria a escolha de uma dessas possibilidades – prefere então saborear o nada que dá nascimento à angústia. Aí está o mistério profundo da vida. (p.50).
A melancolia, todavia, é a saudade do Absoluto que se manifesta na existência até que a Música traga-o de volta à casa da Alma.

Ilha de Itaparica, 13 de junho de 2012, dia de Santo Antonio.

Referências Bibliográficas

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  3. 3.      BENJAMIN, Walter. Origem do drama barroco alemão.  São Paulo: Brasiliense, 1984;
  4. 4.      BETTON, Gérard. Estética do Cinema. São Paulo: Martins Fontes, 1987;
  5. 5.      BETTON, Gérard. Histoire du Cinéma. Paris: Presses universitaires de france, 1987;
  6. 6.      BEYLIE, Claude. As obras-primas do cinema. São Paulo: Martins Fontes, 1988;
  7. 7.      BRAGG, M. O sétimo selo. Rio de Janeiro: Rocco,1995;
  8. 8.      CABRERA, Julio. O cinema pensa. Uma introdução através dos filmes. Rio de Janeiro: Rocco, 2006;
  9. 9.      CAHIERS DU CINEMA.  HYPERLINK "http://www.cahiersducinema.net/-Editorial-.html" http://www.cahiersducinema.net/-Editorial-.html
  10. 10. CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2001.
  11. 11. COLLARD, Cyril. Noites felinas. São Paulo: Brasiliense, 1993;
  12. 12. DELEUZE, Gilles. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 2007;
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  14. 14. GENET, Jean. Querelle. amar e matar. Publicações Europa-américa;
  15. 15. KADARÉ, Ismail.  Abril despedaçado. São Paulo: Companhia das Letras, 2001;
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  17. 17. MAIRE, Gaston. A Alegoria da Caverna, o fim da educação, o Filósofo é constrangido a governar. (República, VII, 514 a-521 b). In: Platão. Lisboa: edições 70, 1986. pp. 78-80;
  18. 18. MATTOS, Marília. O Duplo em Frankenstein. In: Revista Inventário. 4. ed., jul/2005. Disponível no web world wide em: http://www.inventario.ufba.br/04/04mmattos.htm.
  19. 19. NEVES, David E. Telégrafo visual - crítica amável de cinema. São Paulo: Editora 34, 2004;
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  21. 21. POURRIOL, O. CINEFILÔ - As mais belas questõs da filosofia no cinema. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009;
  22. 22. RODRIGUES, Nelson. O beijo no asfalto. Tragédia carioca em 3 atos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1995;
  23. 23. SARTRE, Jean-Paul. Situações IV. Tradução de Maria Eduarda Reis Colares e Eduardo Prado Coelho. Lisboa: Publicações Europa-América, 196-.
  24. 24. SCLIAR, Moacyr. Saturno nos trópicos. A melancolia europeia chega ao Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2003;
  25. 25. SHELLEY, Mary. Frankenstein. 3 ed. Trad. Miécio Araujo J. Honkis. Porto Alegre: L & PM, 1985.
  26. 26. VERNANT, Jean-Pierre & Detienne, Marcel. Métis — As astúcias da inteligência. São Paulo: Odysseus, 2008;




Filmografia:
(optou-se pela 1ª versão dos filmes em destaque)


Filmes sobre A Melancolia
1.     37º2 Le Matin - Betty Blue de Jean-Jacques Beineix (1986);
2.     A Bela da Tarde (Belle du Jour) de Luis Buñuel (1967);
3.     A Estrada da Vida (La Strada) de Federico Fellini (1954);
4.     A Festa de Babette de Gabriel Axel (1987);
5.     A Intrusa de Carlos Hugo Cristensen (1979);
6.     Amor Bruxo de Carlos Saura (1986);
7.     As Horas (baseado na obra de Virgínia Wolf) de Stephen Daldry (2002);
8.     As Invasões Bárbaras de Denys Arcand (2003);
9.     As Lágrimas Amargas de Petra von Kant de Fassbinder (1972);
10. As Pontes de Madison de  Clint Eastwood (1995);
11. Asas do Desejo de Win Wenders (1987);
12. Bagdá Café de Percy Adlon (1987);
13. Blade Runner de Ridley Scott (1982);
14. Carrington – Dias de Paixão de Christopher Hampton (1995);
15. Casablanca de Michael Curtiz (1942);
16. Deus e o Diabo na Terra do Sol de Glauber Rocha (1964);
17. Doutor Jivago de David Lean (1965);
18. Drugstore Cowboy de Gus Van Sant (1989);
19. Frankenstein, de Kenneth Branagh (1994);
20. Heighlander – O Guerreiro Imortal de Russel Mulcahy (1986);
21. Hiroshima, Mon Amour de Alain Resnais (1959);
22. Imensidão Azul de Luc Besson (1988);
23. Melancholia de Lars Von Trier (2011) ;
24. Mishima: uma vida em quatro tempos de Paul Schrader (1985);
25. Moby Dick de John Huston (1956);
26. Morangos Silvestres (Smultronstället) de Ingmar Bergman (1957) ;
27. Morte em Veneza de Luchino Visconti (1971);
28. Noites Felinas, (les nuits fauves) de Ciryl Collard (1993);
29. O Anjo Exterminador (El Anjel Exterminador), de Luis Buñuel (1962);
30. O Estrangeiro de Luchino Visconti (1967);
31. O Menino e o Vento de Carlos Hugo Christensen (1967);
32. O Morro dos Ventos Uivantes (Wuthering Heights), de William Wyler (1939);
33. O Pagador de Promessas de Anselmo Duarte (1962);
34. O Retrato de Dorian Gray de Albert Lewin (1945);
35. O Sétimo Selo, (det sjunde inseglet) Ingman Bergman (Suécia – 1956);
36. O Último Samurai de Edward Zwick (2003);
37. O Velho e o Mar de John Sturges (1958);
38. Orfeu Negro de Marcel Camus (1959);
39. Pantaleão e as Visitadoras de Francisco J. Lombardi (2000);
40. Paris Texas, de Win Wenders (1984);
41. Persona de Ingmar Bergman (1966);
42. Plata Quemada de Marcelo Piñeyro (2000);
43. Querelle. Rainer Fassbinder (1982);
44. Rastros de Ódio (The Searchers) de John Ford (1956);
45. Segredo de Brokeback Mountain de Ang Lee (2005);
46. Sexo por Compaixão de Laura Mañá (2001);
47. Twin Peaks (série de TV) * [não se trata do filme] de David Lynch (1990);
48. Vidas Secas de Nelson Pereira dos Santos (1963);
49. Vivos e os Mortos, Os de John Huston (1987).
50. Zorba, o grego de Michael Cacoyannis (1964).


   Filmes sobre A Alteridade
(*) Considera-se filmes sobre a alteridade aqueles que abordam a questão essencial do “outro” como forma de rejeição, aniquilamento ou busca de identidade.

1.      1984 de Michael Radford – baseado na obra homônima de George Orwell (1984);
2.      2001, Uma Odisséia no Espaço de Stanley Kubrick (1968);
3.      A Caminho de Kandarah de Mohsen Makhmalbaf (2001);
4.      A Elegância do Ouriço [Le Hérisson] de Mona Achache (2009);
5.      A Excêntrica Família de Antonia de Marleen Gorris (1995);
6.      A Fita Branca [Das WeiBe Band] de Michael Haneke (2009);
7.      A Missão de Roland Joffé (1986);
8.      A Morte do Caixeiro Viajante de László Benedek (1951);
9.      A Pele que Habito [La Piel que Habito] de Almodóvar (2011);
10.  Adeus, Minha Concubina [Ba Wang Bie Ji] de Chen Kaige (1993);
11.  Amor em Tempos de Guerra [Um Amour a Taire] de Christian Faure (2005);
12.  Babel de Alejandro Gonzáles Iñárritu (2006);
13.  Bagdad Café de Percy Adlon (1987);
14.  Beleza Americana de Sam Mendes (1999);
15.  Casa da Areia de Andrucha Waddington (2005);
16.  Crash – no limite de Paul Haggis (2004);
17.  Doze Homens e Uma Sentença de Sidney Lumet (1957);
18.  Eclipse de uma Paixão de  Agnieszka Holland (1995);
19.  Entrevista com Vampiro de Neil Jordan – Roteiro de Anne Rice (1994);
20.  Farrapo Humano de Billy Wilder (1945);
21.  Hamlet de Laurence Olivier (1948);
22.  Inimigo Meu de Wolfgang Petersen (1985);
23.  Les Egarés [Os Fugitivos] de André Téchiné (2003);
24.  Mississipi em Chamas de Alan Parker (1988);
25.  Narciso Negro de Michael Powell, Emeric Pressburger (1947);
26.  O Céu que nos Protege [The Sheltering Sky] de Bernardo Bertolucci (1990);
27.  O Conde de Monte Cristo de David Greene (1975);
28.  O Corcunda de Notre Dame de William Dieterle (1939);
29.  O Decálogo de Krzysztof Kieslowski (1989);
30.  O Evangelho Segundo São Mateus de Pier Paolo Pasolini (1964);
31.  O Homem Elefante de David Lynch (1980);
32.  O Idiota [baseado no romance de Dostoievski] de Akira Kurosawa (1951);
33.  O Médico e o Monstro de Rouben Mamoulian (1931);
34.  O Morro dos Ventos Uivantes de William Wyler (1939);
35.  O Pagador de Promessas de Anselmo Duarte (1962);
36.  O Piano de Jane Campion (1993);
37.  O Retrato de Dorian Gray de Albert Lewin (1945).
38.  O Segredo dos seus Olhos [El Secreto de Sus Ojos] de Juan José Campanella (2009);
39.  O Signo da Cidade de Carlos Alberto Riccelli (2008);
40.  O Último Samurai [The Last Samurai] de Edward Zwick (2003);
41.  O Vampiro de Durseldorf de Fritz Lange (1931);
42.  Olga de Jaime Monjardim (2004);
43.  Papillon de Franklin J. Schaffner (1973);
44.  Robinson Crusoé de Luis Buñuel (1953) ;
45.  Salada Russa em Paris (Salades Russes), de Yuri Mamin (1993);
46.  Sociedade dos Poetas Mortos de Peter Weir (1989);
  1. Teorema de Píer Paolo Pasolini (1968);
48.  Terra de Ninguém (No Man´s Land) de Danis Tanovic (2001);
49.  Traídos pelo Desejo de Neil Jordan (1992);
50.  Vidas Secas de Nelson Pereira dos Santos (1963);

Filmes GLBT de Categoria - Drama
 (*) considera-se de primeira qualidade cinematográfica o roteiro adaptado original, música e fotografia.

1.     Autre Que Les Autres – (Anders Als Die Anderen) de Richard Oswald – Primeiro Filme Gay, Realizado na Alemanha (1919);
2.     Bangkok Love Store(*) de Poj Arnon (2007);
3.     Beautiful Thing [Delicada Atração] de Hettie Mac`Donald, 1996;
4.     Bent de Sean Mathias (1997);
5.     Carrington – Dias de Paixão de Christopher Hampton (1995);
6.     Contracorrente de Javier Fuentes-Léon (2009);
7.     David´s Birthday – Il compleanno de Marco Filiberti (2009);
8.     Dernière Cigarette (2003) de Stéphane Rideau;
9.     Do Começo Ao Fim de Aloizio Abranches (2009);
10. Drugstore Cowboy de Gus Van Sant (1989);
11. Formes d´Amour (Formas de Amor) de Christophe Donner (2006).
12. Furyo – Em Nome da Honra de Nagisa Oshima (1983);
13. Garotos de Programa de Gus Van Sant (1991);
14. Gata em Teto de Zinco Quente de Richard Brooks (1958);
15. Get Real [Caia na Real] de Simon Shore, (1998);
16. Gone, But not forgetten [sem tradução] de Michael Akers (2003);
17. Green Plaid Shirt de Richard Natale, (1996);
18. Jeffrey de Christopher Ashley, (1995);
19. Kavafis de Yannis Smaragdis (1996);
20. L´Homme Blessé de Patrice Chéreau (1983) ;
21. Leçons de Ténèbres de Andrzej Burzynski (1999) ;
22. Les Nuits Fauves [Noites Felinas] (*) de Cyril Collard (1992) ;
23. Les Roseaux Sauvages [Juncos Silvestres] de André Tochine (1994);
24. Lilies de John Greyson (1997);
25. Ludwig de Luchino Visconti (1972);
26. Madame Satã de Karim Ainoüz (2002);
27. Making Love de Arthur Hiller (1982);
28. Maurice(*) de James Yvori (1987);
29. Minha Adorável Lavanderia de Stephen Frears (1985);
30. No Night is Too Long [Nenhuma Noite é Longa o Bastante] (*) de Tom Shankland (2002);
31. O Amor não tem Sexo de Stephen Frears (1987);
32. O Banho Turco – Hamam (*) de Ferzan Ozpetek (1997);
33. O Fantasma de João Pedro Rodrigues (2000);
34. O Segredo de Brockeback Mountain (*) De Ang Lee (2005);
35. Plata Quemada (*) de Marcelo Piñeyro (2000);
36. Priscila, A Rainha do Deserto de Stephan Elliott (1994);
37. Querelle de Rainer Fassbinder (1982);
38. Shelter [De repente Califórnia] (*) de Jonah Markowitz (2007);
39. Son Frère [Irmãos] de Patrice Chéreau (2003) ;
40. Soundless Wind Chine (Carrilhão de Vento Silencioso)(*) de Hung Hing Kit (2009);
41. Tempestade de Gelo de Ang Lee (1997);
42. The Bubble – Há Buah [sem tradução] (*) de Eytan Fox (2006);
43. The Priest [O Padre] de Antonia Bird (1995);
44. The Trip de Miles Swain (2002);
45. Torch Song Trilogy [Essa Estranha Atração] de Paul Bogart (1988);
46. Un Amour a Taire [Amor em Tempos de Guerra] (*) de Christian Faure (2005);
47. Un Fils de Amal Bedjaoui (2003);
48. Une Affaire de Gout [Uma Questão de Gosto] (*) De Bernard Rapp (1999);
49. Walk on Water [Andando sobre as Águas] (*) de Eytan Fox (2004)
50. Yossi & Jagger [Delicada Relação] (*) de Eytan Fox – (1996);

 Filmes Temáticos

1.               Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha (1964). Tema: A Jornada do Herói do Sertão;
2.               Metrópolis (Metropolis), de Fritz Lang (1926). Tema: Catábase (descida) e Anábase (subida) da iniciação do herói;
3.               O Falcão Maltês — Relíquia Macabra (The Maltese Falcon), de John Huston (1941). Tema: antologia policial cuja trama lógico-racional problematiza a busca da Fortuna;
4.               Frankenstein, de Kenneth Branagh (1994). Tema: a solidão do homem sem Deus;
5.               O Anjo Exterminador (El Anjel Exterminador), de Luis Buñuel (1962). Tema: surrealidade da impossibilidade de retorno à realidade pelos que se contaminam pelos ideais burgueses e institucionais;
6.               A Dama do Cine Shangai, de Guilherme de Almeida Prado (1987). Tema: o filme do filme cujos personagens são obra da ficção pós-moderna.
7.               Matador, de Almodóvar (1986). Tema: busca do ´desejo´ pelos símbolos arcaicos da transformação;
8.               Rastros de Ódio (The Searchers), de John Ford (1956). Tema: a solidão e a amargura do chamado do herói;
9.               O Cristal Encantado (The Dark Crystal), de Jim Henson (baseado na obra O Senhor dos Anéis) (1983). Tema: o desafio da Hýbris (desmedida) e do Métron (medida) na condição humana;
10.           O Morro dos Ventos Uivantes (Wuthering Heights), de William Wyler (1939). Tema: o choque com a alteridade;
11.           O Encouraçado Potemkim (Bronenosets Potymkin), URS, de Sergei M. Eisenstein (1925). Tema: a nova trama moderna da compreensão do social;
12.           Salada Russa em Paris (Salades Russes), de Yuri Mamin (1993). Tema: o resgate de a utopia no refazer da crise política e existencial do homem moderno que nega a liberdade;
13.           O Sétimo Selo, (Det Sjunde Inseglet) de Ingmar Bergman (1956) parábola do homem perante a Morte e o Infinito;
14.           Querelle, de Rainer Fassbinder (1982) Baseado na obra Querelle de Jean Jenet. Tema : via crucis do desejo ;
15.           A Última Tentação de Cristo (The Last Temptation of Christ), de Martin Scorcese (1988), baseado no livro de Nikos Kazantzakis. Tema: a jornada do herói messiânico;
16.           A Caixa de Pandora (Pandora´s Box), de G. W. Pabst (1928). Tema: o “diásparagmos” (despedaçamento) da sociedade moderna — expressionismo alemão, marco na história do cinema mudo.
17.           Paris Texas, de Win Wenders (1984). Tema: de algum lugar a lugar nenhum o homem da pós-modernidade que tenta tramar seu destino pelas leis do efêmero.
18.           A Lei do Desejo (La Ley Del Deseo), de Pedro Almodóvar (1987). Tema: homoeroticidade medida pela moral cristã burguesa espanhola.



   Filmes Latino-Americanos

1.     A Dívida Interna de Miguel Pereira (Argentina/Reino Unido – 1988)
2.     A Estratégia do Caracol (La Estrategia Del Caracol) de Sergio Cabrera (Colômbia – 1993)
3.     A Intrusa (baseado num conto de Jorge L Borges) de Carlos Hugo Christensen (Brasil/Argentina – 1979)
4.     Abril Despedaçado de Walter Salles (Brasil - 2001)
5.     Bolívia de Adrián Caetano (Argentina – 2001)
6.     Cartões Postais de Leningrado de Mariana Rondón (Venezuela – 2007)
7.     Como Água para Chocolate de Alfonso Arau (México - 1992)
8.     Crônica de um Niño Solo de Leonardo Fávio (Argentina - 1965)
9.     Cronos de Guillermo del Toro (México – 1993)
10. Dawson Ilha 10 de Miguel Littin (Chile – 2009)
11. Deus e o Diabo na Terra do Sol de Glauber Rocha (Brasil - 1964)
12. El Amor en Los Tiempos de Cólera de Gabriel Garcia Marquez, dirigido por Mike Newell (Colômbia - 2007)
13. El Automóvil Gris de Enrique Rosas (México - 1919)
14. El Cielo, La Terra, y La Lluvia (O Céu, A Terra e a Chuva) de José Luis Torres Leiva (Chile – 2008)
15. El Dependiente de Leonardo Fávio (Argentina - 1969)
16. El Nino del Barro de Jorge Algara (Argentina/Espanha – 2007)
17. El Niño pez de Lucía Puenzo (Argentina/França/Espanha – 2009)
18. El Otro de Ariel Rotter (Argentina/França/Alemanha – 2007)
19. El Vuelco Del cangrejo de Oscar Ruiz Navia (Colômbia – 2009)
20. Eva Perón, A Verdadeira História de Juan Carlos Desenzo (Argentina – 1996)
21. Gatica El Mono de Leonardo Favio (Argentina - 1993)
22. Habana Blues de Benito Zambrano (Cuba/Espanha/França – 2005)
23. Herencia de Paula Hernández (Argentina – 2001)
24. Invasão escrito por Jorge Luis Borges de Hugo Santiago – (Argentina – 1969)
25. Japón de Carlos Reygada (México/Holanda/Alemanha/Espanha – 2002)
26. La Antena de Esteban Sapir (Argentina – 2007)
27. La Noche de los Lápices de Hector Oliveira (Argentina – 1986)
28. La Teta Asustada de Claudia Llosa (Peru/Espanha-2008)
29. Lista de Espera de Juan Carlos Tabio (Cuba – 2000)
30. Los Viajes Del Viento de Ciro Guerra (Colômbia - 2009)
31. Morango e Chocolate de Tomás Gutiérrez e Juan Carlos Tabio (Cuba/Espanha/México – 1994)
32. Nazareno Cruz y El Lobo de Leonardo Fávio (Argentina - 1975)
33. Ninguém escreve ao Coronel de Arturo Ripstein (México – 1999)
34. O Beijo [baseado na obra O Beijo no Asfalto de Nelson Rodrigues] de Flávio Tambellini (Brasil – 1965)
35. O Céu Dividido de Julián Hernández (México – 2006)
36. O Crime do Padre Amaro de Carlos Carrera (México – 2002)
37. O Homem do Lado (El Hombre de Al Lado) de Mariano Cohn e Gaston Duprat (2010 – Argentina);
38. O Labirinto de Fauno de Guillerme del Toro (México/Espanha/EUA – 2006)
39. O Pagador de Promessas de Anselmo Duarte (Brasil – 1962)
40. O Sangue do Condor de Jorge Sanjinés (Bolívia – 1969)
41. O Signo da Cidade de Carlos Alberto Riccelli (Brasil - 2008)
42. P.V.C.-1 de Spiros Stathoulopoulos (Colômbia – 2007)
43. Pantaleão e as Visitadoras de Francisco Lombardi (Peru/Espanha – 1999)
44. Plata Quemada de Marcelo Pinero (Argentina - 2000)
45. Qué Viva México! de Serguei Eisenstein (México - 1932)
46. Raízes do Brasil – Documentário (vida e obra de Sérgio Buarque de Holanda) de Nelson Pereira dos Santos (2003)
47. Sem Nome de Cary Fukunaga (México/EUA – 2009)
48. Sexo por Compaixão de Laura Mañá (México – 2001)
49. Temporada de Patos de Fernando Eimbck (México – 2004)
50. Viva Zapata! de Elia Kazan (EUA-1952)




[1] Professor de Filosofia e Ética da Universidade Federal da Bahia – UFBA, atualmente desenvolve pesquisa sobre O Tempo e a Melancolia da Alteridade.
[2]  A data exata foi 28 de Dezembro de 1895. Neste dia, no Salão Grand Café, em Paris, os Irmãos Lumière fizeram uma apresentação pública dos produtos de seu invento ao qual chamaram Cinematógrafo. O evento causou comoção nos 30 e poucos presentes, a notícia se alastrou e, em pouco tempo, este fazer artístico conquistaria o mundo e faria nascer uma indústria multibilionária. O filme exibido foi  L'Arrivée d'un Train à La Ciotat. (Nota: http://pt.wikipedia.org/wiki/Historia_do_cinema).
[3] Além de representar “movimento” cinema também significa “sala de projeção”.
[4] Estética: Parte da filosofia voltada para a reflexão a respeito da beleza sensível e do fenômeno artístico. (Fonte: Dicionário Houaiss).
[5] Alexander Baumgarten (1714-1762), filósofo alemão, foi o criador do termo, como a ciência das faculdades sensitivas humanas, investigadas em sua função cognitiva particular, cuja perfeição consiste na captação da beleza e das formas artísticas. (Fonte: Dicionário Houaiss).
[6] Alegoria da Caverna contida no Livro VII da República de Platão: “— Agora — disse eu —, imagina a nossa natureza, conforme ela é ou não iluminada pela educação, de acordo com o quadro seguinte”. Imagina uns homens numa morada subterrânea em forma de caverna, cuja entrada, aberta à luz, se estende ao longo de toda a fachada; eles estão ali desde a infância, as pernas e o pescoço presos a correntes, de forma que eles não podem mudar de lugar, nem olhar para outro lado senão em frente; porque os grilhões impede-os de virar a cabeça; a luz de uma fogueira acesa ao longe sobre uma elevação de terreno brilha atrás deles; entre o fogo e os prisioneiros há um caminho elevado; ao longo deste caminho imagina um pequeno muro, semelhante aos tabiques que os manobradores de marionetes levantam entre eles e o público e em cima dos quais mostram as suas proezas. — Veja isso - disse ele. — Imagina agora, ao longo deste pequeno muro, uns homens como toda a espécie de utensílios, que ultrapassam a altura do muro, e figuras de homens e de animais, em pedra, em madeira, de toda a espécie de formas; e naturalmente entre os transportadores que desfilam, uns falam, outros não dizem nada. — Estranho quadro e estranhos prisioneiros são esses — disse ele. — Eles parecem-se conosco — respondi eu. — E em primeiro lugar, pensas que nesta situação eles pudessem ver de si mesmo e dos seus vizinhos qualquer outra coisa que não fossem as sombras projetadas pelo fogo sobre a parte da caverna que está em frente deles? — Poderia ser de outro modo — disse — se eles são obrigados a ficar com a cabeça imóvel durante toda a vida? — E quanto aos objetos que desfilam, não acontece o mesmo? — É forçoso. — Desde logo, se pudessem conversar entre eles, não pensas que acreditariam nomear os próprios objetos reais, ao nomearem as sombras que veriam? — Necessariamente. — E se houvesse também um eco que reenviasse os sons do fundo da prisão, de todas as vezes que um dos passantes viesse a falar, não acreditas que eles tomariam a sua voz pela da sombra que desfilasse? — Sim, por Zeus — disse. — É indubitável — afirmei eu — que aos olhos daquelas pessoas a realidade não poderia ser outra coisa senão as sombras dos objetos confeccionados. — Não podia ser de outro modo — disse. — Examina agora como eles reagiriam, se os livrassem das cadeias e os curassem da ignorância, e se as coisas se passassem naturalmente como se segue. Se um desses prisioneiros fosse libertado, e forçado subitamente a endireitarem-se, a virar o pescoço, a andar, a levantar os olhos para a luz, todos estes movimentos fá-lo-iam sofrer, e o encandeamento impedi-lo-ia de olhar os objetos cujas sombras via há momentos. Pergunto-te o que poderá ele responder, se lhe disserem que, há momentos, ele apenas via nada sem consistência, mas que agora, mais perto da realidade e encarando objetos mais reais, ele vê mais corretamente; se por fim, ao mostrarem-lhe cada um dos objetos que desfilam diante dele, o obrigam com perguntas a dizer o que é. Não crês que ficaria embaraçado e que os objetos que ele via há momentos lhe parecerão mais verdadeiros do que aqueles que lhe mostram agora? — Muitos mais verdadeiros — disse. — E se o forçassem a olhar para a própria luz, não crês que os seus olhos lhe doeriam e que se desviaria e se voltaria para as coisas que ele pode olhar, e que as julgaria realmente mais distintas do que aquelas que lhe mostram? — Acredito — anuiu. — E se — continuei — o forçassem a sair de lá, se o fizessem subir a elevação rude e escarpada, e se não o largassem até que o tivessem arrastado à luz do sol, não pensas que ele sofreria e se revoltaria ao ser arrastado desse modo, e que, uma vez chegado à luz, ele teria os olhos encandeados pelo seu brilho, e não poderia ver objeto algum dos que nós chamamos agora de verdadeiros. — Ele não poderia — disse —, pelo menos imediatamente. — Com efeito — voltei eu —, ele teria de se habituar, se quisesse ver o mundo superior. Inicialmente, o que ele olharia mais facilmente seriam as sombras, depois as imagens dos homens e outros objetos refletidos nas águas, depois os próprios objetos; depois erguendo o olhar para a luz dos astros e da lua, ele contemplaria durante a noite as constelações e o próprio firmamento mais facilmente do que o faria durante o dia, ao sol e ao brilho do sol. — Provavelmente. — Por fim, penso, seria o sol, não nas águas, nem as suas  imagens refletidas em qualquer outro ponto, mas o próprio sol na sua própria permanência, que ele poderia olhar e contemplar tal como é. — Necessariamente — disse. — Depois disso, acabaria por concluir, quanto ao sol, que é ele quem produz as estações e os anos, que governa tudo no mundo visível e que é de qualquer modo a causa de todas as coisas que ele e os seus companheiros viam na caverna. — É evidente — disse — que ele chegaria aí depois das suas diversas experiências. — Se depois ele pensasse na sua primeira morada e na ciência que aí existe, e se pensasse nos companheiros de cativeiro, não acreditas que ele se felicitaria da mudança e que teria pena deles? — É certo que sim. — Quanto às honrarias e às homenagens que eles poderiam fazer uns aos outros, e quanto às recompensas dadas àquele que discernisse com o olhar mais penetrante os objetos que passassem que se lembrasse da forma mais exata daqueles que passassem regularmente em primeiro ou em último, ou juntos, e que por isso era o mais hábil a adivinhar o que iria acontecer pensas que o nosso homem as desejasse, e que invejaria aqueles que estivessem entre os prisioneiros em poder de honrarias e do poder? Não pensaria como Aquiles de Homero, e não preferiria cem vezes ser apenas um servente de charrua ao serviço de um pobre lavrador e suportar todos os males possíveis de preferência a voltar às suas antigas ilusões e viver como vivia? — Sou da mesma opinião que tu — disse ele. — Preferiria sofrer tudo isso a reviver essa vida. — Imagina ainda o seguinte — prossegui eu. — Se o nosso homem voltasse a descer e retomasse o seu antigo lugar, não teria os olhos ofuscados pelas trevas, ao vir bruscamente do sol? — Certamente que sim disse — E se lhe fosse preciso de novo julgar daquelas sombras e concorrer com os prisioneiros que nunca deixaram a suas correntes, enquanto a sua vista está ainda perturbada e antes que os olhos se tenham recomposto e acostumado à obscuridade, o que exigiria um tempo bastante longo, não se prestaria ao riso e não diriam dele que, por ter subido ao cimo, voltou de lá com os olhos doentes, que até nem valia a pena tentar a ascensão; e, se alguém tentasse libertá-los e conduzi-los para cima, e se o pudessem agarrar e matar, não o matariam? — Certamente que o matariam — disse. — Agora — prossegui eu — é preciso, meu caro Gláucon, aplicar exatamente esta imagem ao que dissemos atrás: é preciso associar o mundo visível à permanência na prisão, e a luz do fogo com que ela é iluminada, ao efeito do sol; quanto à subida até o mundo superior e à contemplação das suas maravilhas, vê nisso a subida da alma ao mundo inteligível, e não te enganarás quanto ao meu pensamento, pois que o desejas conhecer. Deus sabe se ele é verdadeiro; de qualquer modo, é minha opinião que nos últimos limites do mundo inteligível está a idéia de bem, de que nos apercebemos com dificuldade, mas que não nos podemos aperceber sem concluir que ela é a causa universal de tudo o que há nele de bem e de belo; que, no mundo visível, foi ela que criou a luz e a distribui; e que, no mundo inteligível, é ela que distribui e faz obter a verdade e a inteligência, e que é preciso vê-la para se ter uma conduta com sabedoria, tanto na vida privada como na vida pública. (Gaston MAIRE. A Alegoria da Caverna (República, VII, 514 a-521 b) pp. 78-80).
[7] Alguns desses merecem, desde já, destaque: Deus e o Diabo na Terra do Sol de Glauber Rocha; Metrópolis de Fritz Lang; O Morro dos Ventos Uivantes de William Wyle; Querelle de Fassbinder; Moby Dick de John Huston; O Cristal Encantado de Jim Henson (N. do A.).
[8] Muitas foram as influências de Glauber, em Terra em Transe, assim como La Trema (Luchino Visconti, 1948) teria sido a matriz de Barravento, destacando-se a de Federico Fellini, de Orson Welles (1915-1985) na elaboração dos campos visuais e no espacial de televisão sobre Porfirio Diaz, e de Jean-Luc Godard nos tempos da montagem e na linha de abordagem política. Essa arqueologia autoral, entretanto, não leva em consideração que a questão não está nas influências, ocultas ou evidentes, que a obra de Glauber Rocha expõe, mas na coerência, na instrumentalização, recriação ou revisão dessas influências. Enfim, num grande cinema do mundo. (Fonte: Jaime Rodrigues, Um filme sobre a periferia do poder. In: Cinema, p. 32)
[9] Uma alegoria (do grego αλλος, allos, "outro", e αγορευειν, agoreuein, "falar em público") é uma figura de linguagem, mais especificamente de uso retórico, que produz a virtualização do significado, ou seja, sua expressão transmite um ou mais sentidos que o da simples compreensão ao literal. Diz b para significar a. Uma alegoria não precisa ser expressa no texto escrito: pode dirigir-se aos olhos e, com freqüência, encontra-se na pintura, escultura ou noutras formas de linguagem. Embora opere de maneira semelhante a outras figuras retóricas, a alegoria vai além da simples comparação da metáfora. A fábula e a parábola são exemplos genéricos (isto é, de gêneros textuais) de aplicação da alegoria, às vezes acompanhados de uma moral que deixa claro a relação entre o sentido literal e o sentido figurado. (fonte: Wikipédia).
[10] Ensaísta alemão (Berlim 1892-fronteira da Espanha com a França 1940). Foi em sua juventude amigo do hebraísta Gerhard Scholem, que o introduziu no estudo da mística hebraica, assim como do conhecido pensador Ernst Bloch. Estudou em Berlim, Freiburg e em Mônaco. Laureou-se em Berna (1918) com a dissertação Conceito de Crítica de Arte no Romantismo Alemão. Entre 1923 e 25 trabalha na tese Origens do Drama Alemão, publicada em 1928, com que espera receber a habilitação em filosofia pela Universidade de Frankfurt. A tese é entretanto rejeitada. Sob influência de Lukács, aproxima-se do comunismo. Liga-se a Adorno e Horkheimer, com eles, e ainda Marcuse, constitui os nomes mais famosos da chamada escola de Frankfurt. Do ponto-de-vista de estudo da situação contemporânea da arte, Benjamin é, entretanto a figura mais importante do grupo. Com o advento do nazismo, escreveu durante algum tempo sob pseudônimo, até ser obrigado a emigrar.  Em "A obra de arte..." (1936) o autor desenvolve a tese que os procedimentos de reprodução técnica feriam mortalmente a ideia da unicidade da obra, a qual fazia com que esta se revestisse de um halo que a distinguia: a aura. A aura do objeto de arte dependia, portanto de seu hic et nunc. A obra se individualizava do mesmo modo que os grandes personagens: seu valor estava na relação direta de sua raridade. A aura assim, ao mesmo tempo que assegurava uma função para o objeto de arte, o envolvia numa atmosfera aristocratizante-religiosa que obscurecia a sua qualificação mesma de arte. Desta maneira, ao desparecimento da aura, por efeito de sua multiplicação técnica, passam a corresponder efeitos tanto sociais quanto estéticos Sob o primeiro aspecto, a arte perde sua propensão aristocrática, do ponto-de-vista estético, a contemplação desinteressada é substituída pela experiência da arte como contato, participação e divertimento. (fonte: http://www.filoinfo.bem-vindo.net/Walter-Benjamin).
[11] Gilles Deleuze (1925-1995) Uma das grandes contribuições de Deleuze foi ter se utilizado do cinema para expor sua forma de pensamento, através dos conceitos de imagem-movimento e imagem-tempo. Deleuze foi um dos filósofos que teorizou as instâncias do atual e do virtual (já elaboradas por outros pensadores), construindo um olhar sobre o mundo a partir das possibilidades: "Um pouco de possível, senão sufoco" (fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Gilles_Deleuze).
[12] Relativa a Heráclito (535-475 a.C), filósofo pré-socrático que da cidade de Éfeso (atual Turquia) que definiu pela primeira vez o conceito de Devir, em se referindo ao Vir-a-Ser de todas as coisas. O panta rei é uma consequência de polemos (guerra, conflito), que reina sobre tudo. Em consequência, Heráclito de Éfeso não é o filósofo do "tudo flui" mas do "tudo flui enquanto resultado da tensão contínua dos opostos em luta". Heráclito, inserido no contexto pré-socrático, parte do princípio de que tudo é movimento, e que nada pode permanecer estático - Panta rei ou "tudo flui", "tudo se move", exceto o próprio movimento. Em relação à ontologia, afirmou que “Todo Ente é no Ser”, influenciando, até a contemporaneidade filosófica o entendimento do ente no Ser, principalmente ao filósofo alemão Martin Heidegger.
[13] Referente a isso, leia-se o texto do mesmo autor: A culpa melancólica: Adão e Caim sob a égide de saturno, disponibilizado no www.repositorio.ufba.br.
[14] Igualmente, a resenha: O Tempo e a Melancolia em Brokeback Mountain (o amor é uma força da natureza) foi publicada pelo Suplemento Literário Seo João de Montes Claros, MG disponibilizado no endereço: http://www.seojoao.com.br/seojoao05/index.html e inserido no blog: “filosofia e coisas da vida” na internet: http://filosofiaecoisasdavida.blogspot.com.br/2011/11/o-tempo-e-melancolia-em-brockeback.html.
[15] Considerações acerca desse assunto estão contidas no capítulo: “O grito da culpa” da obra Ética do Absurdo do mesmo autor e disponibilizado no endereço internet: www.repositorio.ufba.br.
[16] Baseado na obra de Ismail Kadaré, publicada pela Companhia das Letras em 2001. “É o mês de abril de algum ano da década de 1930. O cenário são os montes Malditos do norte da Albânia. Ali o século XX se manifesta apenas pela passagem esporádica de um avião. Sob os cumes nevados há um reino de bruma, um universo que deita em tempos homéricos. Um código de leis não escritas, o Kanun, rege a vida e a morte dos montanheses. Seu valor supremo é a honra. Em nome dela, famílias inteiras passam gerações a se matar — a *recuperar o sangue* em rituais infindáveis de vingança. O Kanun é implacável: determina quem matará e quem será morto, especifica minuciosamente quando, onde e como. À sombra dessa #Constituição da morte#, Ismail Kadaré recorta a silhueta trágica de suas personagens e as acompanha até a fronteira da loucura”. (fonte: editorial da publicação de Abril Despedaçado, Companhia das Letras).
[17] Blade Runner é um filme de ficção científica norte-americano de 1982 dirigido por Ridley Scott e estrelado por Harrison Ford, Rutger Hauer, Sean Young, Edward James Olmos e Daryl Hannah. O roteiro, escrito por Hampton Fancher e David Peoples, é vagamente baseado no romance Do Androids Dream of Electric Sheep?, de Philip K. Dick.
O filme mostra uma distópica Los Angeles em novembro de 2019, onde robôs orgânicos criados geneticamente chamados de replicantes—visualmente indistinguíveis dos humanos—são fabricados pela poderosa Corporação Tyrell, como também por outros "mega fabricantes" ao redor do mundo. Seu uso na Terra é banido e os replicantes são exclusivamente usados para trabalhos perigosos, servis e de prazer nas colônias extraterrestres da Terra. Replicantes que desafiam esse banimento e retornam para a Terra são caçados e "aposentados" pelos operativos especiais da polícia conhecidos como "Caçadores de Andróides". O enredo se foca em um brutal e astuto grupo de replicantes que recentemente escapou e está se escondendo em Los Angeles, e no aposentado Caçador de Andróides Dick Deckard, que relutantemente concorda em realizar mais um trabalho para caçá-los. (fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Blade_Runner)
[18] Um dos grandes filmes de Luchino Visconti, Os Deuses Malditos (Götterdämmerung, 1969), aborda a decadência dos Von Essenbeck, uma família poderosa do ramo siderúrgico, no momento em que Adolf Hitler assume o poder. A partir do assassinato do patriarca da família, o barão Joachim von Essenbeck, Visconti esculpe uma narrativa densa, marcada pelo rigor clássico que lhe é peculiar, e investiga a origem do mal na Alemanha do período imediatamente anterior à Segunda Guerra Mundial. Com sequências antológicas, como a de Helmut Berger imitando Marlene Dietrich, em O Anjo Azul, ou a reconstituição do incêndio do Reichstag, em Berlim, em 1933, e da Noite dos Longos Punhais, em 1934, momentos graves, importantes para a consolidação do nazismo, o filme integra a trilogia alemã de Visconti, ao lado de Morte em Veneza (1971) e Ludwig (1972). (fonte: http://pontocedecinema.blog.br/blog/luchino-visconti-investiga-a-origem-do-mal-em-os-deuses-malditos/).
[19] Frankenstein. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-06-15]. Disponível na www: <URL: http://www.infopedia.pt/$frankenstein>.
[20] Foi Otto Rank quem, em 1841, no ensaio intitulado Der Doppel Gänger (O duplo) introduziu este conceito na literatura psicanalítica. Freud também abordou este tema, especialmente no trabalho denominado Das Unheimlich (O estranho) escrito em 1919. Seu foco é o sentimento de estranheza causado pela súbita perda da distinção entre imaginação e realidade, provocando temor e tremor. Para melhor elucidar seu significado, Freud, recorre a um recurso lingüístico: a palavra alemã unheimlich (estranho). Seus opostos são heimlich(íntimo, secreto, obscuro) e heimich (natural), cujo oposto é “familiar”. Entre as diferentes nuances de significado, a palavra heimlich pode exigir uma idêntica a seu opostounheimlich. Ele então parte do conto O homem de areia, de E.T.A Hoffman, para ilustrar como estes dois antônimos chegam a coincidir semanticamente. MATTOS, Marília. O Duplo em Frankenstein. In: Revista Inventário, Disponível - www.inventario.ufba.br/04/04mmattos.htm.
[21] O Estrangeiro — Resenha crítica de Jean-Paul-Sartre: “Mal saiu da tipografia, O Estrangeiro (L'Étranger), de Albert Camus, teve o maior sucesso. Dizia-se e repetia-se que era o melhor livro desde o armistício. Entre a produção literária da época, esse romance era ele próprio um estrangeiro. Chegava-nos do outro lado da linha, do outro lado do mar; falava-nos do Sol, nessa desabrida Primavera sem carvão, não como duma maravilha exótica, mas com a familiaridade cansada de quem o gozou bastante; não lhe interessava enterrar mais uma vez e com as próprias mãos o antigo regime, nem imbuir-nos a sensação da nossa indigni­dade; ao lê-lo, recordava-se que tinha havido outrora obras que pretendiam valer por si mesmas e que nada queriam provar. Mas, como contrapartida desse caráter gratuito, o romance era bastante ambíguo: como se poderia compreender essa personagem que, no dia seguinte ao da morte da mãe, “tomava banho, iniciava uma aventura amorosa irre­gular e ia rir diante dum filme cômico”, que matava um árabepor causa do Sol” e que, na véspera da sua execução, afirmando quetinha sido feliz e continuava a sê-lo”, desejava muitos espectadores à roda do cadafalso para “o receber com gritos de ódio”? Uns diziam: “é um tonto, um pobre diabo”; outros, mais inspirados: “é um inocente”. Mas fal­tava compreender o sentido dessa inocência (SARTRE, 196-, p. 01).
[22] Vide obra do mesmo autor Ética do Absurdo, disponibilizado no site: www.repositorio.ufba.br.
[23] Diasparagmós – arte do despedaçamento encontrada em diversos mitos gregos, particularmente em Dioniso, quando do seu primeiro nascimento tivera sido despedaçamento pelos Titãs a mando de Hera.
[24] Twin Peaks é uma série de televisão norte-americana criada por Mark Frost e David Lynch. A série segue a investigação do Agente do FBI Dale Cooper sobre o assassinato da popular estudante colegial Laura Palmer. O episódio piloto de Twin Peaks foi exibido pela primeira vez em 8 de abril de 1990 na ABC, que acabou levando a outros sete episódios que formam sua primeira temporada e uma segunda temporada de 22 episódios, que foi ao ar até 10 de junho de 1991. (fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Twin_Peaks).
[25] O filme, As Horas, baseia-se no livro de Michael Cunningham, que, por sua vez, se inspirou no romance “Mrs. Dalloway” de Virginia Woolf. O enredo trata da história de três mulheres que carregam em suas vidas muitos sentimentos em comum, como a insatisfação e o fracasso. São retratos de vidas em épocas diferentes, que se entrelaçam através de um livro, “Mrs. Dalloway”. É um filme de alma feminina, onde, nos artifícios da trama, outras mulheres se reconhecem no drama existencial de cada uma das personagens, humanizando assim o lado da ficção. Uma mulher que gostaria de ser uma personagem de um romance, uma que o escreve (a própria Virgínia Woolf), outra que o vive. (fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/As_Horas_(filme).

[26] Dois homens se encontram numa cilada do destino e se apaixonam mortalmente. Maek é um assassino com missão de matar Iht. Maek trabalha para a Máfia e seus crimes sustentam a mãe HIV positivo e o irmão. Em uma missão, ele tem que seqüestrar um policial jovem e belo e entregar a seu chefe. Durante a luta com a vítima, ele leva um tiro no ombro. Iht cuida do seu algoz e começa a fluir a paixão entre os dois. Eles negam os seus desejos homoeróticos, por conta da profissão deles, mas a paixão é mais forte. (fonte: http://gayload.blogspot.com.br/2009/12/bangkok-love-story.html).
[27] Donatien Alphonse François de Sade, o Marquês de Sade, (Paris, 1740  Saint-Maurice, 1814) foi um aristocrata francês e escritor libertino. Muitas das suas obras foram escritas enquanto estava na Prisão da Bastilha, encarcerado diversas vezes, inclusive por Napoleão Bonaparte. De seu nome surge o termo médico/sadismo, que define a perversão sexual de ter prazer na dor física ou moral do parceiro ou parceiros. Foi perseguido tanto pela monarquia (Antigo Regime) como pelos revolucionários vitoriosos de 1789 e depois por Napoleão. [fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Marquês_de_Sade].
[28] Site: “making off” de cinema, comentário sobre o filme Melancholia, postado em 10 de agosto de 2011.
[29] (N. do A.)
[30] Estado de grande apatia e inanição, que apresentavam muitos escravos trazidos da África, decorrente do desterro, o que, às vezes, podia levar à morte. (Figurado) - Nostalgia; melancolia; desânimo; abatimento tristeza; prostração. (fonte: http://www.dicionarioinformal.com.br/banzo/)
[31] Um dos diretores argentinos mais conhecidos internacionalmente volta a investir na dupla de atores Ricardo Darín e Soledad Villamil em um filme que mistura drama e enredo policial na mesma medida. El Secreto de Sus Ojos busca equilibrar constantemente a verborragia argentina, com diálogos rápidos e carregados de regionalismos/humor/palavrões com uma certa levada sentimentalista – que privilegia troca de olhares românticos e sedutores. Narrada em dois tempos, esta história segue uma linha de direção tradicional por Juan José Campanella. O diretor consegue, com pulso firme, envolver o espectador em uma história que joga com múltiplas dúvidas e a incerteza entre o limite entre realidade, distorções da memória e ficção. O mérito principal desta produção, contudo, reside no excelente trabalho de Darín e a sua parceria afinada com Villamil e o comediante (aqui em papel dramático) Guillermo Francella.
[32] http://www.cineplayers.com/critica.php?id=1855
[33] Aos interessados sobre o tema, leia-se o artigo do autor sobre O grito da culpa que faz parte integrante do livro Ética do Absurdo – Albert Camus, disponibilizado no site: www.repositorio.ufba.br.

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